Olá pessoal.
Finalmente estou de férias, e por isso, há mais tempo para falar com vocês.
Hoje estive conversando com minha amiga Janaína Pardin, do Centro Espírita Raio de Sol, e falamos muito sobre as velhas questões que tem me deixado tão perplexo, angustiado até, e a ela também, entre outros que ela mesma citou.
Falamos sobre a questão da consciência, que o Professor Paulo Freire entendia como um ato que conduz à liberdade. Mas, para se ter consciência, é preciso, segundo Freire, ter prática renovadora vinculada às teorias defendidas por um sujeito dentro de sua História que, muitas vezes é determinante na História também de muitas outras pessoas. Caso contrário, o agir por agir, simplesmente, ou pior, o não agir, leva ao Determinismo das ações, das situações...leva a acreditar naquela história de que as coisas são do jeito que são porque tinham que ser assim, e não há nada a fazer...Diante dessa última afirmação eu sempre faço a mesma pergunta: Será?
E daí nunca me saiu da cabeça esse questionamento, que em parte foi respondido hoje por essa amiga: como podem alguns espíritas terem "consciência tranquila" diante de Deus, fazendo obras de caridade com caráter assistencialista, se há todo um sistema reproduzindo a desigualdade? Não que isso não seja importante e não estou desmerecendo quem faça isso. O mundo precisa dessas ações, mas essas ações não podem criar uma Filosofia Conformista, de que fazendo isso, se faz a Caridade necessária à evolução, e o resto se resolverá com o tempo.
A sociedade Contemporânea, é marcada por fortes traços de injustiça social, que muitos espíritas dizem que se resolverão com a evolução da humanidade. Isso em sí, já é um Determinismo, é jogar para o destino, para a sorte, para Deus, enfim, a responsabilidade das ações que tem de ser feitas por nós. Janaína também se diz espantada com essas afirmações no meio espírita, que têm em mãos, tantos conhecimentos codificados por Allan Kardec. Pois é muito fácil ver as injustiças sociais e esperar, apenas esperar - diferente daquele Esperançar que pregava Paulo Freire -, mas esperar que os espíritos tomem cosciência dos seus erros para não reencarnarem mais como mendigos de rua, esperar que os políticos evoluam a ponto de não usarem mais a máquina do Estado em benefício próprio, enfim, esperar, apenas isso.
Vejamos: Se um mendigo vive naquelas condições por ter abusado em outras vidas do dinheiro, é lógico que ele está sofrendo a Lei de Causa e Efeito, até esse ponto eu concordo com esse pensamento, porém, isso nos isenta de uma maior participação política? Há espíritas que não querem saber de política por a confundirem com politicagem, que coloca os interesses pessoais acima dos interesses coletivos, que é, ou ao menos deveria ser, o objetivo da política.
É preciso lembrar o exemplo maior que temos: Jesus. Há quem diga que Jesus não nasceu para Reformas Políticas. Porém, não devemos esquecer que Ele viveu na Palestina do século I, marcada pela Política Teocrática. Fariseus não deixavam de ser representantes do Estado Judaico - sujeito a Roma, mas com uma certa autonomia -, só porque eram representantes da religião local. Estado e Religião se misturavam no tempo de Jesus. E mesmo assim, Jesus chamou muitas vezes os Fariseus de hipócritas, por quererem provar que Ele estava errado, baseados numa Lei que determinava o pensamento religioso da época e que o próprio Jesus seguiu, até a idade em que saiu para mostrar que aqueles ensinamentos de Moisés se resumiam em dois mandamentos apenas: Amar a Deus sobre todas as coisas, e ao próximo como a si mesmo. Jesus ao propor isso, não tinha discurso político, não fazia parte de partidos, como entendemos o partidarismo hoje, mas propos uma nova consciência moral, que teria seus efeitos no social e político, e a História mostra isso, na aceitação do Cristianismo como Filosofia de Vida, que mudou os hábitos morais e as condições sociais dos cristãos.
Atualmente, mesmo com os conhecimentos trazidos pelos Espíritos de Luz, há quem ainda faça do Espiritismo uma mistificação, determinando "certo" e "errado". Mas o que é certo e o que é errado? Quem está em condições de determinar? Tenho um amigo, João Oliveira, que é um bom palestrante, profundo conhecedor do Evangelho, mas que não pode fazer palestras em muitas casas, por não ter curso de palestrante. Ele já é um senhor idoso, e quando começou a trabalhar no Espiritismo, digamos que as casas eram menos burocráticas.
Daí eu penso: O espiritismo burocrático de certas pessoas não está caindo no determinismo? A Doutrina Espírita, codificada por Kardec, nada tem de contrário às livres iniciativas do Ser, desde que essas o façam evoluir, e não prejudiquem ninguém, mas o pedantismo inerente a algumas pessoas, cria determinismos que desanimam, irritam, e quando eu por exemplo, questiono, a frase que escuto é sempre a mesma: "Faça a sua parte". O que é, então, fazer minha parte? Calar e me conformar? E o caráter filosófico da Doutrina? É mentira? Claro que não. Mas talvez aqui nem se trate de mentiras, é a postura de alguns irmãos que estão criando uma espécie de Espiritismo Paralelo, um Espiritismo Determinista, que consola é verdade, os necessitados, mas que faz calar os que se atrevem a questionar posturas muitas vezes esdrúxulas de presidentes de centros espíritas por exemplo, que criam regras que muitas vezes nos fazem pensar: Por que isso?
Relembrando novamente Paulo Freire, essa semana coloquei aqui mesmo nesse blog a frase em que ele dizia que quanto mais ele lia Marx, mais encontrava fundamentação objetiva para se tornar camarada de Cristo.
Eu vou mais longe e coloco junto com Marx, Bakunin. E os dois eram ateus que lutaram por seus irmãos injustiçados, sem ficar pressupondo se as pessoas sofridas da época eram espíritos que usaram mal suas fortunas no passado. Exploração é exploração, Marx e Bakunin sabiam disso. Agora, junto com Marx e Bakunin eu colocaria, parafraseando Paulo Freire, Allan Kardec..."Quanto mais leio Marx, Bakunin e Kardec, mais encontro fundamentação objetiva para continuar sendo camarada de Cristo". Talvez porque Bakunin e Marx lutaram, assim como Jesus, pelos mais necessitados, os doentes da sociedade. E Kardec com a Doutrina Espírita, nos trouxe os "porquês" de nossas dores, nossas lutas, enfim, nossa caminhada evolutiva.
Haverá quem diga que Marx e Bakunin deixaram teorias que criaram Ditaduras, mas a Inquisição, as Cruzadas e outras lavagens cerebrais que temos ainda hoje, em nome de Jesus, também não são Ditaduras?
O Grande Médico, Jesus, não teve discurso político, mas mudou a política romana com seu discurso que aliviava tanto dores do corpo quanto da alma. Marx e Bakunin não tinham discurso religioso mas talvez pela nobreza de seus ideiais, mesmo sendo ateus, se aproximaram mais de Cristo do que nós, que mesmo crendo, perdemos tempo determinando livros, exigindo cursos de palestrante sem observar primeiro a boa vontade e o nível espiritual do irmão que quer palestrar, mas satisfazendo dessa forma a Burocracia,entre outros "desculpismos" que atrasam a marcha evolutiva do coletivo.
Jesus, Marx, Bakunin e Kardec deixaram seus legados. E essa geração de espíritas (sem generalizações lógico), deterministas, o que deixará?
- Uilson Carlos
2 comentários:
Oi, Uilson!
Contundente seu texto "Espiritismo Determinista?"... um belo ponto de partida para aprofundar questionamentos e condutas no MEB.
MEB e Doutrina Espírita não são a mesma coisa: a segunda é simples, direta e profunda. Já a primeira... comporta n tipos de tendências...
Para acrescentar algo ao debate: o monitor do curso da Doutrina que faço, formado em História, conta que havia um colega de classe cujo bordão era: "Marx é amor!" Conta também que esse colega era motivo de chacota, mas amigavelmente, por defender essa posição.
Não me considero em condições de julgar o quanto de amor havia em Marx ao lançar as bases do Comunismo. Até acho que as intenções dele eram elevadas e contemplavam a Humanidade como coletividade.
Porém tenho muitas dúvidas com relação à Ditadura do Proletariado e ao Materialismo Histórico... duas condições com muita solução de continuidade, muito restritas e que soam mais como opinião pessoal do Marx do que como algo exequível rumo à virtude coletiva.
Lembrando que o Evangelho Segundo o Espiritismo demonstra a inutilidade da distribuição de riqueza. Os Espíritos da Codificação explicaram a Kardec e a nós que seria uma medida paliativa, pois em pouco tempo essa igualdade seria desfeita, devido à diferença de aptidões e de inteligência.
Mas o Espiritismo nada postulou sobre "o sistema de governo certo", "o sistema econômico certo" etc. Os bons espíritos só nos aconselham em temas de ordem ética, para reforma íntima. A forma a ser dada a isso na vida comum, para a inclusão de todos e dinamização da política, da economia, da sociedade e outras, estão a cargo da boa vontade e criatividade humanas.
Abraço,
Olá Evaristo, como sempre nos honrando com suas contribuições expressadas nas belas palavras que você sempre nos traz.
Eu me lembro mesmo dessa parte em que os espíritos falavam da distribuição da riqueza, e realmente Evaristo, não há como ser diferente. Os espíritos têm razão, pois uma distribuição das riquezas não traria a "igualdade"...mas a minha bandeira não é que as pessoas, principalmente os espíritas, façam a distribuição de renda sonhada por Marx. Mas a concentração também poderiam ser menos desigual, desumana...eu sei Evaristo, de acordo com os ensinamentos da doutrina que não há injustiçados, mas isso também não é desculpa para muitos espíritas terem aqueles discurso leviano que parte do pressuposto de que, se alguém sofre, é porque deve haver fortes razões para isso.
Fazendo isso os espíritas que agem dessa maneira, não perceberam que estão caindo no julgamento precipitado, e Jesus dizia: Não Julgueis.
O Espiritismo Evaristo, nos trouxe uma grande contribuição ética sim, mas somos éticos?
Levar uma ajuda de caráter assistencialista como eu já disse várias vezes, mas fechar os olhos para as estruturas políticas desumanas, é fé ou conivência?
Deixo as perguntas no ar?
Abraço
- Uilson Carlos
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